O Perigômetro masculino

Como se sabe, o cérebro do homem típico é incapaz de se ocupar de mais de um assunto por vez. Isso acontece porque a mente masculina tende a se concentrar totalmente em um único assunto interessante - matemática, ciência, futebol, video-game etc. - esquecendo-se completamente do mundo ao redor. Esta característica pode ser boa para o desenvolvimento científico da humanidade, mas é péssima do ponto de vista reprodutivo: as mulheres simplesmente odeiam ser suplantadas por qualquer coisa na face da terra, seja uma partida de futebol ou o sequenciamento do genoma humano.

Para contornar este problema, a evolução sabiamente dotou o cérebro masculino de diversos sistemas autônomos, que ficam monitorando os sentidos e interrompem a concentração do homem quando detectam alguma situação que requer atenção.
Um dos sistemas automáticos masculinos mais importantes é o Perigômetro. Este sistema serve para alertar o homem distraído quando ele começa a entrar em alguma área perigosa do relacionamento com a mulher. Os alertas do Perigômetro são como os do contador Geiger: eles vão aumentando de intensidade conforme o tamanho do perigo detectado.
Vamos ver um exemplo: é aniversário da Cleide, a gostosona da Contabilidade, e o homem é convidado com outros colegas para comemorar em um barzinho após o expediente. Os alertas que o Perigômetro vai emitir em resposta a este convite dependerão de outros fatores:
-A mulher dele não conhece a Cleide: Esta é uma situação simples, e o Perigômetro só vai emitir um alerta de nível 1: "Alerta! Situação potencialmente perigosa."
-A mulher dele já viu a Cleide: Situação mais complicada, merecendo um alerta nível 2: "Atenção! Perigo à vista!"
-A mulher dele já viu a Cleide e até fez perguntas capciosas sobre ela, como "Simpática aquela sua colega, a Cleide. Ela é casada?": Alerta nível 3: "Cuidado! Encrenca na certa!"
-A mulher dele já viu a Cleide, odiou e só se refere a ela como vagabunda, o que quer dizer gostosona em mulherês: Perigo total! O alerta sobe a nível 4: "Não vá! Caia fora! Catástrofe iminente!"
Mesmo neste último caso, porém, um homem incauto pode buscar argumentos racionais para derrotar seu Perigômetro, e vai acabar pensando em alguma asneira como:
- Ah, não vou perder essa! Vou dizer que o aniversário é do Pereira e pronto! Sem crise!
Santa ingenuidade, Batman! Muitos homens já encontraram seu fim em situações semelhantes. Acontece que as mulheres também tem seu próprio Perigômetro, só que ele alerta para a verdadeira ameaça feminina: a concorrência! Para a mulher, não importa quem é o aniversariante, mas sim quem vai estar lá, e por isso ela vai concentrar seus esforços em descobrir a verdade depois, quando o pobre incauto voltar para casa. Usando dos prodigiosos ardis femininos, a mulher começará uma conversa como quem não quer nada:
- E então, amor, tava bom o aniversário?
- É, tava legal, sim.
- De quem era mesmo? Do Gonzaga? Quantos anos ele fez?
Se não estiver anestesiado pelo alcool consumido, o Perigômetro notará algo errado e começará a emitir insistentes alertas de nível 2. Atordoado pelas duas perguntas em sequência, e vítima da fraca memória masculina, o homem não vai conseguir identificar a causa do alerta a tempo:
- Ahn... acho que o Gonzaga fez 30... ou foi 31?
- Engraçado! Não era aniversário do Pereira?
Neste ponto o nível de alerta sobe para 3: o homem foi pego na armadilha e tem de arranjar uma saída rápida:
- Ahn... é um funcionário novo, o Gonzaga Pereira! Tem uns que chamam de Gonzaga, outros de Pereira, sabe como é...
Claro que ela não acredita, mas isso não importa, porque o objetivo é outro:
- Sei... E foi todo mundo? Eu sei que as meninas da Contabilidade não perdem uma!
Xeque! Era aí que ela queria chegar! O Perigômetro solta fumaça emitindo alertas desesperados do nível 4, mas a situação já saiu de controle:
- Ahn... é, as meninas da Contabilidade não perdem mesmo...
- E a Cleide tava no meio, não é?
- Ahn... acho que ela tava junto com as outras...
A tentativa de diluir um pouco a gostosura da Cleide na insipidez das colegas da Contabilidade não funciona. O ouro foi entregue, e o homem vai enfrentar o pior pesadelo masculino, a frase "Ah, então quer dizer...":
- Ah, então quer dizer que o senhor estava comemorando com aquela vagabunda da Cleide até essa hora, né? Com comes e bebes? Ou foram só comes? Blá, blá, blá...
Em desespero total, o Perigômetro dispara alertas de nível 5, que querem dizer: "Socorro! Catástrofe total! Salve-se quem puder!". Tudo inútil. O estrago está feito, e não vai restar ao infeliz outra alternativa senão escutar toda a ladainha e depois ir dormir no sofá (ou com o cachorro) por alguns dias.
Mas afinal, o que a vítima desse exemplo poderia ter feito para evitar toda esta encrenca? Não ir à tal comemoração seria o mais seguro, é claro. Uma vez que o homem foi, porém, deveria ter escutado os alertas do Perigômetro no início da conversa, e batido em retirada com qualquer desculpa esfarrapada:
- Puxa, amor, que mancada! Esqueci que eu tinha prometido pegar minha avó na saída da Balada da Terceira Idade! Coitadinha! Deve estar com a artrite atacada nesse frio! Vou voando lá e depois a gente conversa, tá? - e sumir por uns dois dias, no mínimo, com a desculpa de ter de cuidar da artrite da pobre velhinha.

Para concluir, podemos tirar dois ensinamentos importantes de tudo o que foi exposto:
1) O Perigômetro é um sistema essencial para a sobrevivência masculina, mas o homem tem de atender seus alertas logo nos primeiros níveis. O Perigômetro é como o Créu: ninguém consegue encarar o nível 5. Neste nível, os alertas do Perigômetro são como o alarme de desastre de um submarino afundado: não há para onde fugir.
2) Contra uma frase feminina começada em "Ah, então quer dizer..." não há defesa possível - resta apenas ao homem rezar para que alguma força superior o salve da metralhadora verbal da mulher. Como nem Deus quer se meter nesta encrenca, as únicas forças superiores restantes são as da Natureza. Assim, só resta esperar que um tsunami, furacão, terremoto ou erupção vulcânica lhe dê um destino melhor.